Ruído
- Priscila Roseane
- 1 de jun. de 2022
- 2 min de leitura

Há momentos em que a vida acontece muito lentamente, Sombra do portão que se arrasta pelo jardim. Mas existem ainda aqueles momentos de silenciosa fúria, como o bater de asas de uma borboleta. Explosões sensoriais bombardeiam os sentidos com cheiro de cores mais vivas que a aurora boreal.
A boca seca. As mãos suam. O coração cavalga em disparada de encontro ao todo e ao nada. Deve ser por isso que tenho medo das borboletas. Essa personificação encantadora do bicho papão escondido em baixo da cama. Quando ela entra pela janela e voa em direção a luz, como uma jovem tola correndo para os braços de seu amado. O abraço queima suas asas, derrete suas ilusões. Pureza e inocência feitas em pó.
Mas é no ruído incessante da cidade que a vida realmente acontece. Não na quietude do sono. Não na paz do domingo, vendo os pássaros pousarem nos galhos de laranjeira. São nos encontros do acaso. Entidade sublime, patrono dos apaixonados. É sua sinfonia caótica que transforma a vida no que ela é, linhas invisíveis entrecruzadas formando a realidade.
Momento inefável, involuntário, como o ar que enche os pulmões. Suspiro. O tempo se distorce. O carro freia bruscamente no sinal. Meu coração bombeia o sangue com mais força em minha veias. Colapso. Centenas de veículos emaranhados no transito de São Paulo. O instante momento acontece no pretérito do futuro. O sinal abre. Atravesso a rua apressada. Do outro lado a silhueta desapareceu. O tic-tac do relógio volta ao seu lento compasso. O ruído engole a multidão. Sigo em frente até o ponto de ônibus, pois sei que não o verei mesmo se olhar para trás.
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